Esgarçado desde o 11 de Setembro: O Conceito de Terrorismo como Arma Política
Desde os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, o conceito de terrorismo tem sido amplamente utilizado como uma ferramenta política por líderes mundiais. A “Guerra ao Terror” iniciada pelos Estados Unidos, sob a liderança de George W. Bush e Dick Cheney, não apenas redefiniu o que entendemos por terrorismo, mas também deixou um legado de abusos e manipulações que afetam a política internacional até os dias de hoje.
A Manipulação do Conceito de Terrorismo
A falta de um consenso global sobre a definição de terrorismo tem permitido que diferentes governos utilizem leis antiterrorismo para fins pessoais e políticos. A expressão “Guerra ao Terror”, que inicialmente visava responder aos ataques de 11 de setembro, evoluiu para justificar intervenções militares e políticas que, muitas vezes, desafiam as normas do direito internacional.
O impacto dessa ideologia é visível em diversos países, onde líderes usam a narrativa do terrorismo para justificar ações que vão desde invasões a repressões internas. O conceito de terrorismo se tornou tão maleável que a sua aplicação pode variar drasticamente, dependendo do contexto político e dos objetivos dos governantes.
Como destacou Andrey Ribeiro, mestre em História Comparada pela UFRJ, a sensação de vulnerabilidade que se espalhou pelo Ocidente após os ataques de setembro alterou permanentemente as abordagens de segurança e defesa. Os EUA, por exemplo, tomaram decisões unilaterais que promoveram uma hegemonia global e desencadearam reformas internas com consequências duradouras.
Consequências da “Guerra ao Terror”
Um dos legados mais sombrios da “Guerra ao Terror” é a ampliação das definições de terrorismo, que agora podem incluir ações que, em outros contextos, não seriam consideradas terroristas. Essa expansão tem sido usada para justificar intervenções em países como o Iraque, onde a conexão entre Saddam Hussein e a al-Qaeda foi utilizada como pretexto para uma invasão amplamente criticada por ser ilegal e uma violação do direito internacional.
Sérgio Luiz Cruz Aguilar, professor da Unesp, observa que a comunidade internacional falhou em reagir de forma contundente a essa invasão, permitindo que as ações unilaterais se tornassem uma norma. O resultado foi uma regressão ao realismo político, onde as ações individuais dos Estados prevaleceram sobre a cooperação multilateral.
Definições e Histórias do Terrorismo
A discussão sobre o que constitui terrorismo remonta à Revolução Francesa, quando a primeira menção ao termo surgiu no final do século XVIII. Desde então, a definição de terrorismo tem sido objeto de debate contínuo. Embora haja consenso sobre alguns elementos, como o uso da violência e a busca de objetivos políticos, a forma como esses elementos são interpretados varia consideravelmente.
Nos anos 70, em um contexto de descolonização, países não alinhados tentaram distinguir entre terrorismo e movimentos de libertação nacional. Essa distinção ainda é relevante hoje, especialmente em conflitos como o entre israelenses e palestinos, onde a definição de terrorismo frequentemente é usada para deslegitimar a resistência.
A Maleabilidade do Conceito na Prática Contemporânea
Com os ataques de 11 de setembro, a discussão sobre a definição de terrorismo foi praticamente abandonada, dando lugar a uma abordagem de “cada um por si”. Esse fenômeno é evidente em ações de líderes como Vladimir Putin, que justificou ataques à Ucrânia alegando que o país se tornava uma “organização terrorista”. Internamente, o governo russo utiliza acusações de terrorismo para silenciar opositores.
No Reino Unido, a recente inclusão do grupo Palestine Action na lista de organizações terroristas ilustra como a expressão de apoio a causas políticas pode ser criminalizada. A detenção de mais de duas mil pessoas por protestos pacíficos levanta questões sobre a liberdade de expressão e os limites do poder estatal.
Considerações Finais
O termo “narcoterrorismo”, popularizado por líderes como Donald Trump, tem sido utilizado para justificar operações policiais e militares que visam grupos acusados de tráfico de drogas. No entanto, essa terminologia ignora distinções fundamentais entre organizações criminosas e terroristas, complicando ainda mais a já confusa paisagem do combate ao terrorismo.
Em suma, a manipulação do conceito de terrorismo por líderes políticos não apenas distorce a realidade do que realmente constitui um ato terrorista, mas também enfraquece a resposta global a um fenômeno que continua a representar um desafio significativo à segurança e à paz mundial. A reflexão crítica sobre essa questão é crucial para o desenvolvimento de estratégias eficazes e éticas de combate ao terrorismo, que respeitem os direitos humanos e promovam a justiça social.